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Sunday, May 18, 2008

Engolidor de Homens

Abro os olhos. Não estou de pé. Mas estou virado para baixo e isso é bom, ninguém quer acabar como o Jimi. Estou deitado na berma da estrada, e afigura-se-me o deserto americano.
O azul do céu limpo está mais forte que o calor do Sol, entra-me pelos olhos dentro numa explosão a uma só cor. O pó dentro da minha boca está fresco e é a melhor água que podia encontrar, face a esta secura que não consigo descrever. Mastigo-o, mas não me atrevo a engoli-lo. Sem me conseguir levantar, as imagens levantam perguntas. A que quero responder. E que a cada vertigem tento ignorar. Os jeans têm óleo, e em conjunto com o meu relógio partido e a estrada que separa este vale, são a única prova de civilização num raio de muitos quilómetros. Engulo pó finalmente. Consigo tossir, óptimo. No mesmo movimento puxo uma mão para a frente e apercebo-me que também consigo rastejar. Rastejo até ao meio da estrada, pés e pernas no sentido este-oeste, tronco, braços e cabeça no sentido oeste-este, na pequena esperança de me matarem e me levarem daqui. Vejo um reflexo na ponta de um cacto. Cem metros de distância. Começo a ficar bom a rastejar. Dois lagartos juntam-se na minha cruzada, mordem-se, mordem-me e percebo que é uma corrida. Doze, quinze, somos vinte e três. Vinte e dois dos quais, provavelmente sabem para onde vão e cuja babada avidez esclarece um apetecível destino. E eu comprei energia à agressividade dos meus competidores. Rastejo como nunca o fiz mas a poucos metros desisto! Estou completamente estafado e apercebo-me o ridículo do objectivo. Caio de cara no chão. Estou igual a há pouco, a estrada é que está mais longe de mim. Os lagartos amontoam-se para o photo-finish! Mas eis que a meta se transfigura, reflecte, reluz! Explode com as guitarras a soarem bem alto! O baixo bem lento como a brisa que sopra e a aridez dos riffs descreve de tal forma o ambiente que me vejo a formalizar o acontecimento, gritando: "Isto é sinestesia, meus senhores!!".
O reflexo, sobe! Passa por dentro de si próprio formando nós momentâneos. "Estou dentro da capa de um disco qualquer." - pensei eu. O reflexo ruma ao infinito a uma velocidade incompreensível.
Um camião desce o vale mas eu estou cansado demais para me mexer. Deixo-me ficar... e dou de comer aos lagartos.

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