O Pêndulo
O pêndulo balançava de um lado para o outro, ávido de chegar ao seu limite e voltar para trás só para chegar ao outro limite e voltar para trás outra vez. Balançava daquela maneira que nos faz trocar os nomes das pessoas e comer a sopa com o garfo e deitar fora a garrafa e levar a carica à boca. In-ces-san-te-men-te...
Os olhos não o seguiam bem. Seguiam a sua sombra e, sabendo o exacto ponto em que ele voltava para trás, intersectavam-lhe o movimento a meio caminho. Isso deixava-os claramente satisfeitos. Os olhos sempre foram fáceis de satisfazer.
O som do pêndulo era o som do ar frio. Por muito que esperássemos que ele chegasse ao fim e tocasse na caixa de madeira, fazendo-a falar, no último dos milímetros, regradamente, invertia marcha, com um sorriso irónico de metal. De ouvidos colados ao vidro poder-se-ia, nesse preciso momento, ouvi-lo a rir, de certeza.
Nunca ninguém beijou o pêndulo e muito poucos o terão cheirado. O pêndulo é demasiado abrangente e desfocado. Já alguém o pintou de sobretudo e chapéu de côco e gravata.
Não seria diferente se tivesse sido pintado com nódoas de mostarda e suor debaixo dos braços, a morrer de enfarte do miocárdio.
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